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Abraçando o Medo – Por Jorge dos Santos Valpaços

“É hora de criar o RPG de Beladona”. Demorou um tempo até a ficha cair. Passaram alguns dias entre o convite formalizado por Ana Recalde e eu realmente estruturar tudo que precisava pensar para conduzir o processo de criação de um jogo narrativo sobre um universo que tanto gosto. Sim, sou fã declarado de Beladona, tendo acompanhado o quadrinho desde suas primeiras páginas publicadas na internet. E por vezes isso atrapalha um pouco, já que você precisa gerir profissionalmente o desenvolvimento de um texto que não rasure a construção ficcional prévia.


Imerso em outros jogos do Lampião Game Studio – sobretudo na pós-produção de Déloyal – eu estava em uma mescla de atmosfera de dúvida e ansiedade. Tensionado pelo Desafio, decidi enumerar algumas possibilidades. Muitas delas foram anteriormente experimentadas por diversos jogos. Eu não tinha de inventar a roda, uma vez que precisava dialogar com as expectativas dos jogadores. Mas precisava imprimir algo novo. Tudo isso sem deixar de lado à segurança nas mesas, o que somava a um elemento fundamental: o convite a novos jogadores. O RPG de Beladona tinha de ser convidativo àqueles que não possuíam contato prévio algum aos jogos narrativos, sendo inclusive uma porta de entrada a este universo lúdico. Logo, acessibilidade era um fator determinante.

beladona4Ocorre que jogos de terror costumam ser um tanto complexos ao tratar a experiência de jogo, possuindo não apenas mecânicas específicas, mas também elementos em torno do cenário e de propostas que versam com a construção de toda a atmosfera de suspense. Ansiedade, dúvida, necessidade de seguir, receio por fugir. Encontrava-me em uma desconfortável encruzilhada, pressionado pela responsabilidade e repleto de dúvidas. E foi assim que encontrei respostas ao Desafio que se impunha: abracei o Medo.

O suspense necessário em jogos de terror não é condicionado ao choque por algo pavoroso. O horror é um recurso, porém sua banalização esgota um jogo. É o terror que move a narrativa. Logo, tratar a dúvida, a ansiedade em resolver uma situação de Risco; apostar seus Traços e Traumas para resolver um Desafio ou uma Disputa, a despeito dos Traumas que possam se impor; manter uma tensão que pode ser aumentada ou reduzida, de acordo com o andamento da narrativa; e lutar para criar sua própria história foram elementos pensados para estar no centro da experiência de jogo. E tudo isso se deu ao revisitar o processo de formação dos medos humanos.

Neste primeiro texto aqui no blog da Avec, eu, Jorge Valpaços, apresentei como minha ansiedade e os medos em torno do projeto do RPG de Beladona nutriram o meu processo criativo. Tal qual um Sonhador, não neguei meu Medo, mas o abracei para obter o Poder necessário para Seguir em frente. E recorrer a referências de jogos narrativos e outras fontes para tratar a psiquê humana foi imperativo para responder tais questões. Aliás, os termos em maiúsculo que foram grafados nesse breve texto são conceitos que destaquei durante o processo de criação e que hoje se encontram no texto do jogo, sendo indissociáveis da experiência pretendida em um Conto (uma partida).

Quanto ao título? Bem, este foi o mais simples de obter. Lembre-se que Samantha tinha pesadelos… terríveis!
É hora de você também ter os seus.

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